A alma ainda respira
- Angelo Davanço

- 17 de out.
- 1 min de leitura
Por Renato Andrade

Quando os dois policiais americanos entram na viatura com seus donuts e copos térmicos com café aguado eu estou sentado no banco de trás. Acompanho sua conversa sobre a ranzinzice da esposa de uma deles atentamente.
Desço algumas quadras depois a tempo de me emocionar com o diálogo entre o advogado picareta meio amalucado e seu irmão mais velho doido de pedra por inteiro.
Resolvo espairecer e finalmente faço aquele tour completo pelo museu espanhol, vasculho cada nicho da construção.
Prendo a respiração em seguida pois escuto tiros de grosso calibre, meus filhos podem muito bem estar no meio desse fogo cruzado.
A sucessão de vídeos, bons-dias, frases pseudofilosóficas, piadas infames e nem tanto, lágrimas, gargalhadas, reflexões e cobranças justas e injustas desfilam estridentes, como se fizessem parte da paisagem no metrô.
Mas moro em Bonfim Paulista e vem o resgate. Do nada o cheiro familiar e atemporal se insinua pelo estúdio silencioso a essa hora da manhã.
Como que tentando acompanhar o voo de uma borboleta, saio com os olhos semifechados e busco apurar melhor a doce e reconfortante fragrância. Fica mais forte e sei que isso significa que logo vai evaporar de vez.
Puxo cada fiapo desse conforto pelas narinas e vem a plenitude de saber que a alma ainda respira. A sensação só é válida porque inexplicável e efêmera.
Como me sinto tão vivo quando bate aqui na roça esse maravilhoso, irreproduzível e milenar cheiro de bosta de vaca!





Comentários